Jenipapo das Vieiras, MA

‘Mais um número’: Segundo ataque a indígenas Guajajara em menos de dois meses deixa outros dois mortos

Por Maria Fernanda Ribeiro

Etnia foi alvo de cinco assassinatos em menos de cinco meses; especialistas falam em ‘genocídio indígena’

Morreram na hora os caciques Firmino Praxede Guajajara, 45, e Raimundo Benício Guajajara, 38. Outros dois indígenas ficaram feridos. Eles voltavam para casa de moto pela BR-226, na Terra Indígena Cana Brava, em Jenipapo dos Vieiras (MA), quando foram alvejados por tiros. Era 7 de dezembro de 2019, um sábado. Oito meses depois, as investigações não foram concluídas e não se sabe quem são os mandantes e executores dos crimes.

“A polícia não encontrou os assassinos até agora. As mortes são mais um número, mais uma estatística e isso traz pânico a todos nós”, afirma um indígena que não quis se identificar por já ter sofrido ameaças.

Foi o segundo ataque a tiros contra indígenas Guajajara em menos de dois meses. Em 1º de novembro de 2019, o guardião da floresta Paulo Paulino Guajajara, 26, foi assassinado em uma emboscada de madeireiros ilegais dentro da Terra Indígena Araribóia.

E outras mortes vieram depois de Raimundo e Benício. Ainda em dezembro, foi assassinado Erisvan Soares Guajajara, de 15 anos. A violência continuou em 2020 com a morte de Zezico Rodrigues Guajajara, alvejado por um tiro de espingarda.

A violência continuou em 2020 com a morte de Zezico Rodrigues Guajajara, alvejado por um tiro de espingarda.

Firmino e Raimundo foram atacados quando voltavam de uma reunião em uma aldeia próxima onde estiveram com diretores da Eletronorte Energia. No encontro, que teve a participação de 60 caciques e lideranças Guajajara, eles discutiram sobre as compensações de impactos ambientais de obras de linhas de transmissão que passam dentro do território.

De acordo com nota enviada pela Polícia Federal, órgão competente pela condução e conclusão das apurações e também pela responsabilização dos envolvidos, as investigações não foram concluídas e não há prazo para o encerramento. “Há algumas hipóteses e linhas investigativas, mas em razão do sigilo e da sensibilidade da investigação, não podem ser divulgadas”, afirma o órgão.

Na Terra Indígena Cana Brava, de acordo com os relatos ouvidos pela reportagem, o maior problema envolve os moradores de cidades próximas ao território, que relacionam os indígenas com os assaltos que acontecem na BR-226. Mas entre as hipóteses levantadas à época dos crimes, estão ainda conflitos com madeireiros e caçadores ilegais dentro dos territórios.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) não retornou aos questionamentos feitos pela reportagem, mas nota divulgada no site do órgão em 31 de julho, em resposta ao site De Olho nos Ruralistas, afirma que as mortes de Firmino e de Raimundo possuem uma linha de investigação seguida tanto pela Polícia Federal quanto pela Secretaria de Segurança Pública do Maranhão, de que se tratava de represália a um assalto praticado por indígenas. A Polícia Federal, no entanto, não confirmou essa informação.

Onde o Estado se omite, o genocídio indígena avança

Carlos Marés, ex-presidente da Funai

O governo do Maranhão informou, também por meio de nota, que somente as primeiras diligências foram feitas pela Secretaria de Segurança Pública do Estado e que os inquéritos abertos foram remetidos à Polícia Federal.

“Onde o Estado se omite, o genocídio indígena avança”, afirma o jurista e ex-presidente da Funai Carlos Frederico Marés. É o caso das aldeias do povo Guajajara no Maranhão, onde essa ausência, segundo Marés, abriu caminho para “um conflito gravíssimo, com o envolvimento de interesses econômicos fortes e pouco éticos.” Desde 2000, o massacre a indígenas Guajajara já deixou 49 mortos – sendo cinco deles no intervalo de cinco meses, entre novembro de 2019 e março de 2020. Até hoje, nenhum crime foi solucionado.

*Colaboraram Diego Junqueira e Mariana Della Barba

Zé Doca, MA

Ele usava as redes sociais para denunciar as injustiças; foi morto com dois tiros pelas costas

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